Um ponto foi sempre importante para o homem, o
qual se traduz pela seguinte pergunta:
Qual a origem das coisas que existem na
natureza e proliferam pelo universo?
Mas, a insatisfação leva o homem a tornar a
pergunta noutra mais complexa:
Haverá uma ordem ou lei comum que para além de
originar, orienta e governa o natural e o humano?
Os filósofos gregos pré-socráticos, ou seja, os
fisikói de Aristóteles, procuravam “o começo”ou “a origem” (“princípio”) de
todas as coisas que existem.
Tales apresenta-nos a água como o elemento
essencial e origem, mas não se questionou quanto ao como e ao porquê de todas
as coisas se originarem ou derivarem de um princípio único.
Anaximandro procurou responder às questões
levantadas. Assim, como Tales, procura a ordem comum e vem a defender a
existência de um só primeiro princípio, elemento primordial e básico, que
origina toda a realidade. Realidade tomada como todas as coisas que existem na
natureza e proliferam pelo universo, todas as outras coisas para além do
princípio, tudo o que vem a ser como fenómeno. No entanto, vai procurar dar
mais inteligibilidade à proposta de Tales. Ele animou-se
em encontrar uma explicação para o problema da mudança constante na realidade na
continuidade do mundo. Parece que se originou em si uma crença relativamente a
esse primeiro princípio, que procurou justificar, ou seja, apesar de ter
proferido declarações apodícticas, pela primeira vez procurou argumentar sobre
esse começo e sobre o cosmos, através de uma percepção bem dirigida e de uma abstracção que se estendia
do sensível até ao inteligível. Por
esse facto veio a ser apelidado de primeiro
filósofo.
Os seus argumentos chegaram até
aos nossos dias sobre a influência do pensamento aristotélico, segundo o
pensamento de outros doxógrafos e através das interpretações dos mais diversos
estudiosos da matéria. Reconstruir a sua argumentação é difícil, e pode levar a
que se entre pelas malhas da conjectura. O que obriga a procurar efectuar uma
análise cuidada das informações disponibilizadas, de modo a nos aproximarmos
daquilo que os seus argumentos devem parecer.
Da
justificação resultou o desenvolver de uma teoria do universo. É o primeiro a formular o
conceito de uma lei universal que preside ao processo cósmico total. A sua teoria do universo assenta em dois pilares: o
conceito apeiron e o conceito kósmos. Através destes conceitos
procura dar uma explicação acerca da origem e funcionamento do universo. Para
tal, conserva o grupo de transformações de Tales de umas formas noutras, não de
um modo imediato, mas através da intermediação do apeiron.
O apeiron
é envolvente do kósmos, espacial e
temporalmente, constitui-se como a garantia da unidade metafísica do universo;
e, é governante de tudo, porque é imortal e imperecível, ou seja é divino. Os
dois conceitos podem ser compreendidos em alternância e em função um de outro.
Isto é, o apeiron em função do kósmo (em que o kósmo se absorve no
apeiron) e o kósmo em função do apeiron (em que o apeiron se subordina
ou reduz ao kósmo).
Ao colocar a questão
fundamental e o seu desenvolvimento em termos de apeiron, versus Kósmo, ou
vice-versa, em que a physis já não é a água, mas o apeiron, um princípio de
outra natureza, uma unidade metafísica, faz dele o primeiro filósofo metafísico.
Na busca racional de encontrar o que permanece, Anaximandro
não encontra o princípio numa natureza finita como a água, elemento que é
derivado e previamente conhecido, matéria que é objecto da nossa experiência,
visto que afecta os nossos sentidos. Pela mesma ordem de razões, não considera
como sendo essa “essência” os elementos ar, terra, fogo, mas algo por trás
dessa capa aparente, com o que realmente tem lugar. Se ele considerasse algum
dos quatro elementos como princípio único originário, esse elemento tenderia,
pela sua própria natureza, a eliminar e a destruir o seu contrário. Veja-se o
caso do fogo. É ilógico pensar que dele pudesse surgir um elemento contrário,
exemplo a água, visto que a observação mostra que ambos tendem a destruir-se.
E, como nós só conhecemos as formas particulares
de “matéria” que emanam do princípio, concebe o princípio, a origem do real,
como algo que não afecta os sentidos, não é objecto da nossa experiência, não
será nenhum elemento particular previamente conhecido, nem nenhuma classe de
matéria particular, será algo distinto, composto de uma matéria desconhecida,
terá de ser de outra natureza. Ele
propõe uma outra
physis e um novo princípio, distintos dos de Tales.
Com originalidade vai postular o princípio,
sobrepondo-o às coisas existentes.
Sem comentários:
Enviar um comentário