quarta-feira, 23 de março de 2016

Metafísica de Anaximandro - MD - Momento 88

Um ponto foi sempre importante para o homem, o  qual se traduz pela seguinte pergunta:
Qual a origem das coisas que existem na natureza e proliferam pelo universo?
Mas, a insatisfação leva o homem a tornar a pergunta noutra mais complexa:
Haverá uma ordem ou lei comum que para além de originar, orienta e governa o natural e o humano?

Os filósofos gregos pré-socráticos, ou seja, os fisikói de Aristóteles, procuravam “o começo”ou “a origem” (“princípio”) de todas as coisas que existem.
Tales apresenta-nos a água como o elemento essencial e origem, mas não se questionou quanto ao como e ao porquê de todas as coisas se originarem ou derivarem de um princípio único.
Anaximandro procurou responder às questões levantadas. Assim, como Tales, procura a ordem comum e vem a defender a existência de um só primeiro princípio, elemento primordial e básico, que origina toda a realidade. Realidade tomada como todas as coisas que existem na natureza e proliferam pelo universo, todas as outras coisas para além do princípio, tudo o que vem a ser como fenómeno. No entanto, vai procurar dar mais inteligibilidade à proposta de Tales. Ele animou-se em encontrar uma explicação para o problema da mudança constante na realidade na continuidade do mundo. Parece que se originou em si uma crença relativamente a esse primeiro princípio, que procurou justificar, ou seja, apesar de ter proferido declarações apodícticas, pela primeira vez procurou argumentar sobre esse começo e sobre o cosmos, através de uma percepção bem dirigida e de uma abstracção que se estendia do sensível até ao inteligível. Por esse facto veio a ser apelidado de primeiro filósofo.
Os seus argumentos chegaram até aos nossos dias sobre a influência do pensamento aristotélico, segundo o pensamento de outros doxógrafos e através das interpretações dos mais diversos estudiosos da matéria. Reconstruir a sua argumentação é difícil, e pode levar a que se entre pelas malhas da conjectura. O que obriga a procurar efectuar uma análise cuidada das informações disponibilizadas, de modo a nos aproximarmos daquilo que os seus argumentos devem parecer.
Da justificação resultou o desenvolver de uma teoria do universo. É o primeiro a formular o conceito de uma lei universal que preside ao processo cósmico total. A sua teoria do universo assenta em dois pilares: o conceito apeiron e o conceito kósmos. Através destes conceitos procura dar uma explicação acerca da origem e funcionamento do universo. Para tal, conserva o grupo de transformações de Tales de umas formas noutras, não de um modo imediato, mas através da intermediação do apeiron.
O apeiron é envolvente do kósmos, espacial e temporalmente, constitui-se como a garantia da unidade metafísica do universo; e, é governante de tudo, porque é imortal e imperecível, ou seja é divino. Os dois conceitos podem ser compreendidos em alternância e em função um de outro. Isto é, o apeiron em função do kósmo (em que o kósmo se absorve no apeiron) e o kósmo em função do apeiron (em que o apeiron se subordina ou reduz ao kósmo). 
Ao colocar a questão fundamental e o seu desenvolvimento em termos de apeiron, versus Kósmo, ou vice-versa, em que a physis já não é a água, mas o apeiron, um princípio de outra natureza, uma unidade metafísica, faz dele o primeiro filósofo metafísico.
Na busca racional de encontrar o que permanece, Anaximandro não encontra o princípio numa natureza finita como a água, elemento que é derivado e previamente conhecido, matéria que é objecto da nossa experiência, visto que afecta os nossos sentidos. Pela mesma ordem de razões, não considera como sendo essa “essência” os elementos ar, terra, fogo, mas algo por trás dessa capa aparente, com o que realmente tem lugar. Se ele considerasse algum dos quatro elementos como princípio único originário, esse elemento tenderia, pela sua própria natureza, a eliminar e a destruir o seu contrário. Veja-se o caso do fogo. É ilógico pensar que dele pudesse surgir um elemento contrário, exemplo a água, visto que a observação mostra que ambos tendem a destruir-se.
E, como nós só conhecemos as formas particulares de “matéria” que emanam do princípio, concebe o princípio, a origem do real, como algo que não afecta os sentidos, não é objecto da nossa experiência, não será nenhum elemento particular previamente conhecido, nem nenhuma classe de matéria particular, será algo distinto, composto de uma matéria desconhecida, terá de ser de outra natureza. Ele propõe uma outra physis e um novo princípio, distintos dos de Tales.

Com originalidade vai postular o princípio, sobrepondo-o às coisas existentes. 

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