quarta-feira, 11 de maio de 2016

Momento

A filosofia é como  a alta cozinha.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

Metafísica de Anaximandro - MD - Momento 94

As menções de Anaximandro

No hilozoismo da cultura grega antiga todas as coisas possuem uma génese, uma vida e a sua aniquilação; em que o elemento vital, é um elemento anímico, uma alma, não necessariamente um espírito (alma inteligente).
Anaximandro menciona a geração (nascimento) e a corrupção (morte), aplicados a todas as coisas. Portanto, ele participa desse hilozoismo. Acrescenta-lhes, no entanto, a sua tese:
-Há um elemento, o apeiron, do qual todas as coisas surgem, auferem a sua vitalidade, nele desaparecem e retornam quando perdem completamente essa vitalidade. Posição que é próxima de Tales.

Também menciona uma regra ou ordem no surgir e desaparecer das coisas.
Não aponta para um caos, mas para um Kósmos, segundo o seguinte:
Um dos sentidos básicos desta palavra grega é “ordem”. É de notar que é comum a toda a civilização grega que a realidade é um só kósmos enquanto princípio ordenador anímico que a mantém unida e ligada nas suas partes. Ora, tal era necessário desde que a noção de ligação e de união não fossem afastadas uma da outra. No entanto, isto remete-nos para as ideias de destino, de onde sobressaem as ideias de:
- Moira - entidade transcendente que amarraria os nós das existências temporais dos seres, e de
- Anake  - personificação divina da Necessidade,  com um papel semelhante.
Quanto à sua ideia de que um ser estar fadado ao aniquilamento, isto é, o ser surge para perecer, aponta para uma concepção trágica da existência, concepção constante nas epopeias de Homero, nas Cosmogonias de Hesíodo, e na Tragédia ática (Esquilo, Sófocles, Eurípedes). É mais uma noção ligada à noção de Destino. Destino, enquanto sentido transcendente que rege e determina todas as coisas, uma espécie de julgamento universal oculto, o qual tem subjacente um princípio julgador oculto, o que não deixa de ser mais um elemento anímico.
O notado anteriormente torna-se mais consistente se for tomado o tema da aniquilação como expiação. Morrer, perecer, deixar de ser, são punições infligidas ao ente que surge arbitrariamente da fonte inicial, o que é injusto, e cuja existência é violenta. O que leva a vincular-se à tradição Orfismo aplicado à alma humana, enquanto potência fatalista, em que a existência é uma sina, todo o agir ou ser tem um carácter negativo e a morte não passa de uma expiação ou redenção. Ora, Anaximandro vislumbra essa potência em todos os entes. Ele transpõe estas ideias, generaliza o princípio órfico porque admite a presença universal do elemento anímico.

Anaximandro menciona também uma ordem do tempo
O inscreve na concepção do tempo cíclico, circular, do eterno retorno dos seres, uma versão em escala cósmica da metempsicose  ou o retorno à existência (para alguns, entendida mais estritamente como reencarnação). O tempo só retorna porque há algo depois do fim, porque o princípio se reitera, se repropõe, se manifesta outra vez.


Metafísica de Anaximandro - MD - Momento 93

A geração não vem de um elemento em mudança, mas a partir do ilimitado, através da separação de contrários devido ao eterno movimento.
Todos os ciclos em sequência de criação, evolução e destruição são fenómenos naturais, que ocorrem a partir do ponto em que a matéria abandona e se separa do apeiron. Anaximandro não dá à criação o carácter material que o seu mestre defendia.
Como o apeiron é infinito e qualquer um dos elementos considerados não o é, tal permite ao apeiron deter o poder de gerar e corromper todas as outras coisas. Dado o seu movimento eterno, o tempo é tal que a geração, a existência e a destruição num universo são limitadas. Assim, necessariamente, o que tem geração ou início tem também fim, o término da sua corrupção. E, a mudança dos seres não pode em si e por si mesmos se determinar.
Durante a luta os contrários vão perdendo o poder que detinham, ou seja vão perdendo a sua vitalidade. E, quando já não possuem qualquer poder cessa a luta entre eles, sendo reabsorvidos no apeiron, ou seja nele desaparecem ou a ele retornam.

A Injustiça
O apeiron é a Lei do Destino e da Justiça:
Tudo o que nasce, um dia vai morrer. Tudo o que é quente, um dia vai esfriar. Tudo o que é grande, pode ser dividido em pedaços mais pequenos. O fogo pode ser combatido com água, e como resultado, fogo e água deixam de existir. Tudo o que existe, somente existe em função de uma emancipação do ser eterno e portanto as coisas ao se separarem deste, são dignas de castigo.
Todo o dualismo entre opostos é uma forma de luta, e como tal, de injustiça. 
A injustiça consiste na predominância de um contrário sobre o outro, no próprio facto de serem contrários, e na alternância dos contrários.
A Justiça é a pacificação dos opostos no Infinito pela sua reintegração neste.
Como
-O mundo nasce da cisão de contrários, de onde se identifica a primeira injustiça, a qual deve ser expiada com a morte ou fim do próprio mundo, que depois renasce, infinitamente, segundo determinados ciclos de tempo.
-O nascimento de cada contrário implica imediatamente a sua contraposição ao outro contrário.
Por essas duas razões, todo o nascimento é uma injustiça, a ser expiada com o futuro aniquilamento.
Assim, sendo, todo o ser finito, por ser limitado, é injusto.     
Há dupla injustiça e, consequentemente, dupla necessidade de ex­piação, visto que:
1 - O nascimento do mundo dá-se através da cisão da unidade do princípio em opostos;
2 – Após a cisão, cada um dos opostos tenta usurpar, com ódio pelo outro, a condição de único sobrevivente e dominador. Uma usurpação, ao mesmo tempo, do lugar e dos direitos do imortal e indestrutível.
Pode-se dizer que as coisas criadas cometem injustiças; é necessário, tendo em conta as injustiças de umas sobre as outras, umas pagarem (penalização) e outras receberem (recompensa), de acordo com a ordenação do tempo.  

Em resumo:
1 – Na geração, o apeiron é o princípio ou o elemento de onde as coisas surgem.
Na corrupção, é no apeiron as coisas desaparecem ou se aniquilam;
O apeiron é Lei da Necessidade:
2 - A geração e corrupção dão-se junto a este princípio e são regidas por ele,  segundo a Lei da Necessidade.
O Princípio é Lei do Destino e da Justiça:
3 - Os diversos seres participam da aniquilação ou corrupção uns dos outros, havendo concessão de justiça e deferência. Ou seja, aniquilar um ente é fazer Justiça, donde se infere que todo surgir de algo, todo escapar da fonte primeira, é uma “injustiça”, uma violência;
4 - O modo como cada ente faz justiça ao outro através da injustiça: cada coisa ao surgir, aniquila violentamente uma outra que lhe precedia, “vingando”, por sua vez, o que aquela fizera com uma outra a qual aniquilou;

5 - Esta “expiação” universal de todas as coisas, não se dá simultaneamente, ao mesmo tempo, mas segundo a ordem do tempo.